segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Livro traz panorama das artes gráficas desde o Império

Antes de ser um mapeamento exaustivo do design brasileiro desde que a primeira máquina de impressão chegou aqui há dois séculos, o livro "Linha do Tempo do Design Gráfico no Brasil" é uma obra panorâmica que reúne peças representativas da produção gráfica brasileira entre 1808 e o fim do século passado. Com lançamento dia 1.º março, no Instituto Tomie Ohtake, o livro foi organizado e projetado por Elaine Ramos, diretora de arte da editora Cosac Naify, em parceria com o designer Chico Homem de Melo, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP. Colecionador de peças gráficas produzidas no Brasil em todas as épocas, o designer garimpou nos sebos da cidade algumas preciosidades que estão no luxuoso volume - aproximadamente 30% das peças, entre capas de livros, discos, ilustrações de revistas, cartazes de cinema e teatro, anúncios publicitários e páginas de jornais.

São 1.600 imagens reproduzidas da coleção do designer, de acervos públicos e particulares, antiquários e livreiros. A primeira delas, de 1747, saiu da oficina de Antonio Isidoro da Fonseca. É um rara peça gráfica impressa no Brasil no longo período de três séculos em que a atividade tipográfica esteve proibida no País por decreto da Corte portuguesa. Obviamente, por temer o poder subversivo da palavra impressa, ela ordenou a interrupção das atividades do gráfico em seguida. Impedidos de exercitar sua arte, os tipógrafos tiveram de esperar a chegada da família real e, mesmo assim, só na segunda metade do século 19 é que alguns deles, mais corajosos, desafiaram as convenções para brincar com palavras e imagens, abrindo caminho para a experimentação moderna.

Os periódicos dedicados à sátira política, que proliferam na década de 1860, são os veículos desse furor experimental, revelando caricaturistas como o alemão Henrique Fleiuss, o italiano Angelo Agostini e o brasileiro Rafael Bordalo Pinheiro como pioneiros da arte da ilustração.

Artistas gráficos ousados exigem editores igualmente sintonizados com o experimentalismo. Homem de Melo destaca o papel do escritor Monteiro Lobato e da editora que levava o seu nome, nos anos 1920, na descoberta de jovens talentos. Ele revelou o versátil J. Prado e apostou, um ano antes da Semana de Arte Moderna de 1922, nas inovações do carioca de Di Cavalcanti, que, aos 24 anos, assinou para ele uma revolucionária graphic novel, "Os Fantoches da Meia-Noite".

Nem todos os artistas gráficos foram tão modernos. "É certo que os ilustradores desse segundo período das artes gráficas no Brasil descendem do humor e da pintura realista", observa Homem de Melo. Enquanto a vanguarda russa levantava a bandeira do construtivismo, os ilustradores brasileiros curtiam a ressaca do art nouveau, abraçando três anos depois da Semana de 22 o grafismo art déco, embora nenhum dos dois estilos fosse predominante, segundo Homem de Melo. As revistas modernistas (Klaxon, Arlequim, Ariel) deram um novo impulso aos artistas experimentais, que renovaram o repertório visual com o geometrismo de Tarsila do Amaral e Paim.

Nos anos 1930, a questão da identidade brasileira, levantada pelos modernistas, marca o advento de uma nova arte gráfica que revela Goeldi e Santa Rosa como ilustradores preocupados com ela. Nos anos 1940, a fotografia colorida concorre com a sutileza e elegância dos traços de ambos - e a orgia cromática da popular revista O Cruzeiro estabelece as regras do mercado até que o Brasil dos anos JK resolve ingressar de fato na modernidade com Brasília, a bossa nova e a arte concreta. Foi na década de 1950 que a Bienal trouxe a abstração para o Brasil e a arquiteta Lina Bo Bardi criou um instituto para a difusão do design. "Os anos 1950 foram os da semeadura, a década de 1960 foi a da explosão e a seguinte, a da consolidação do design brasileiro", resume Homem de Melo.

A editora de arte Elaine Ramos, que organizou anteriormente a "bíblia" da disciplina, História do Design Gráfico, de Philip Meggs e Alstron Purvis, diz que a hegemonia do modernismo eclipsou outras escolas e tendências que o livro resgata. "A questão da autoria não foi nosso foco, era a linha do tempo e o valor individual das peças que nos interessava." Naturalmente, não se ignorou a presença de criadores como Alexandre Wollner, Geraldo de Barros, Almir Mavigner, Mary Vieira e Amilcar de Castro, mestres da linguagem construtiva nos anos 1950, década que viu nascer aqui a arte do austríaco Eugênio Hirsch. O livro de design dá especial atenção aos anos 1960 e 1970, que ampliou o diálogo com a arte gráfica estrangeira, como comprova a capa do disco Milton (de Kélio Rodrigues, 1970), tributo ao designer americano Milton Glaser.

Nas décadas mais recentes, a dupla de autores identifica a volta da ilustração no lugar da fotografia como sintoma mais forte de uma certa retromania. "A manipulação das imagens pelos meios eletrônicos é exagerada", analisa Elaine Ramos, enquanto Homem de Melo justifica o fenômeno como fruto de um certo "esgotamento da linguagem fotográfica digital, que leva o artista a tentar a recuperação do sabor original do design gráfico". Hoje, segundo ele, há uma certa mania conceitual "que conduz os criadores a fórmulas e à perda da espontaneidade".

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