sábado, 19 de novembro de 2011

Artistas criam desenhos para tatuar na pele de obras vivas

Eles dão a pele por uma obra. Num apartamento no 19º andar do edifício Copan, no centro de São Paulo, 12 pessoas cederam o próprio corpo para os desenhos de uma artista, concordando em vesti-los para sempre.

Almudena Lobera é quem desenha, no papel, as imagens. Isabel Martínez Abascal, a tatuadora, grava traços na pele dos participantes, ou portadores, como a dupla se refere às cobaias artísticas.

Essas artistas espanholas passaram um mês recrutando interessados em virar suportes de uma obra que deve durar o tempo de uma vida.

No contrato assinado, eles se comprometeram a receber o desenho na pele e a serem mostrados como obras.

Nesta sexta-feira, na galeria Vermelho, Lobera e Martínez Abascal fazem a primeira exposição de seus tatuados. No ano que vem, imagens deles seguem para Madri, Barcelona e Zaragoza, na Espanha.

"A obra é sobre a perda de uma imagem, como quando vendemos um desenho", diz Lobera. "Eles adquirem a obra dando a pele como suporte, e os desenhos se consomem como bens de mercado, sumindo à medida que a pessoa envelhece e morre."

Mas sobrevive um certificado de autenticidade que cada portador recebe pelo desenho que leva no corpo. "Questionamos a ideia de posse no mercado de arte", afirma Martínez Abascal. "Não é só um desenho ou uma tatuagem, é também um ritual de confiança mútua."
 






Foi nesse aspecto "visceral" da tatuagem que Amilton Santos pensou quando também começou uma série de tatuagens como obra de arte.

"Quem se deixa tatuar precisa confiar muito em mim", explica ele. "É uma sedução que deve acontecer de forma satisfatória entre a gente."

Em festas, o artista faz com nanquim e uma agulha de costura o desenho de uma forma geométrica no corpo de um ou mais voluntários.

"Aquilo acaba absorvendo a carga emocional daquele dia", diz Santos, que depois copia no próprio corpo a tatuagem que faz nos outros.

Enquanto jovens artistas encontram agora na tatuagem um suporte vivo para obras de caráter mais lúdico e menos ácido, marcas sobre a pele já causaram muita polêmica no meio artístico.

No fim dos anos 90, o espanhol Santiago Sierra fez uma série de performances em que pagou desempregados e prostitutas US$ 30, ou o equivalente ao valor de uma dose de heroína, para que deixassem tatuar nas costas uma linha preta contínua.

Em vez de um desenho, Sierra gravou na pele de voluntários remunerados a marca de uma violação, denunciando a condição de explorados pelo sistema da arte.

Na mesma pegada, o artista carioca Ducha pagou os R$ 1.500 que recebeu do programa Rumos, seleção de jovens artistas do Itaú Cultural, a um caseiro para que raspasse a cabeça e tatuasse atrás dela a logomarca do banco.

"Decidi fazer com alguém a mesma coisa que o Itaú fazia comigo", conta Ducha. "Queria que essa exploração fosse vivenciada e que eu fosse o agente da exploração."

Wim Delvoye também pensou na ideia de marca como símbolo de valor e exploração quando decidiu tatuar porcos vivos com o brasão da grife de luxo Louis Vuitton.

Depois de criar desenhos sobre couro de porco, o artista belga passou a usar os bichos ainda vivos e teve a obra declarada ilegal na Bélgica por maus tratos aos animais. Ele então se mudou para a China onde tem uma fazenda para continuar o trabalho.

Suas composições sobre pele vêm acompanhadas de sua assinatura, como se fossem produtos em série que valorizariam na medida em que os porcos engordassem.

"Faço uma arte invendável, que cresce e chama a atenção de uma forma irônica", resumiu Delvoye em entrevista a uma revista canadense. "É o mesmo princípio do mercado de capitais, que também opera com juros e suas margens de lucro."

PORTADORES
QUANDO sexta-feira (18/11), às 19h
ONDE Galeria Vermelho (r. Minas Gerais, 350, São Paulo, SP tel. 0/xx/11/3138-1520)
QUANTO grátis




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